A vereadora Duda Salabert (PDT), primeira mulher transexual eleita em Belo Horizonte, denunciou um salão de beleza por negar o seu atendimento, na última segunda (25).
“Eu me senti humilhada, porque o que estava sendo negado ali não era fazer a minha sobrancelha. O que estava sendo negado era a minha identidade, a minha dignidade”, afirmou em entrevista à Folha.
A vereadora disse que é importante que situações como a que ela vivenciou ganhem repercussão, para que haja visibilidade para o tema da violência contra as pessoas transexuais e travestis.
Salabert, que foi a vereadora mais votada na capital mineira em 2020, também disse que, após sofrer duas ameaças de morte, pensa em concorrer a um cargo federal em 2022. Uma decisão oficial, no entanto, só será tomada no ano que vem.
Sobre o apoio a Ciro Gomes, provável candidato de seu partido nas eleições presidenciais do ano que vem, ela diz que a principal preocupação no pleito é vencer Jair Bolsonaro (sem partido) e seus apoiadores.
A vereadora diz ainda que considera que os principais desafios do campo progressista no ano eleitoral serão o combate às fake News e ao discurso de ódio.
PERGUNTA – Na segunda (25), a senhora denunciou nas redes sociais que teve o atendimento negado em um salão de beleza. Como isso aconteceu?
DUDA SALABERT – Eu fui a um salão de beleza no Shopping Cidade. O salão estava vazio, eu disse que queria fazer a sobrancelha e a atendente respondeu que só fazia sobrancelhas femininas. Eu respondi que era esse modelo que eu queria, porque a minha sobrancelha é feminina.
Eu expliquei que eu sou uma mulher transexual e gostaria de ser atendida. Essa funcionária, olhando para as outras, disse: ‘nós não vamos te atender, porque você é um homem’. Aí eu saí da loja e fui fazer a reclamação junto ao atendimento ao cliente do shopping. Eu me senti humilhada, porque o que estava sendo negado ali não era fazer a minha sobrancelha. O que estava sendo negado era a minha identidade, a minha dignidade.
P. – Como a administração do shopping lidou com a situação?
DS – O shopping pediu desculpas, disse que não tolera nenhum tipo de discriminação e que é um espaço aberto à diversidade. Eles disseram que iriam conversar com a responsável da loja.
P. – A senhora fez, ou pretende fazer, uma denúncia formal em relação ao caso?
DS – Sim. Eu entendo que essa posição é importante a fim de dar um contorno pedagógico à questão, uma vez que muitas pessoas desconhecem que transfobia é um crime inafiançável. Muitas pessoas desconhecem que o crime de transfobia é equiparado ao racismo no Brasil. É importante tomar esse tipo de atitude, a fim de que episódios como esse não se repitam contra as pessoas travestis e transexuais. Mais importante que punir é educar.
Como a senhora vê a repercussão desse tipo de situação nas redes sociais e nos veículos de comunicação? Eu acho extremamente importante, porque aborda um tema que foi historicamente silenciado, a violência contra pessoas travestis e transexuais. Muitas pessoas estavam dizendo que tem que respeitar a decisão do estabelecimento. Mas acima da decisão do estabelecimento há uma lei federal e um entendimento da Suprema Corte de que não atender pessoas travestis e transexuais é um crime que gera reclusão de um a três anos.
P. – A senhora foi a primeira vereadora trans eleita em Belo Horizonte. A transfobia já afetou seu trabalho como vereadora?
DS – Sim. De modo geral, os vereadores me respeitam e me receberam muito bem. Mas houve episódios de transfobia explícita, por exemplo, no dia das mulheres em que criou-se uma mesa diretora só com mulheres e eu fiz parte. Um vereador bolsonarista disse que não iria tolerar que um homem ocupasse esse espaço e reproduziu inúmeras mensagens de ódio contra mim. Fato que levou o meu gabinete a processar esse vereador.
P. – A senhora está trabalhando em um programa de tolerância zero em relação ao assassinato de pessoas transexuais e travestis em Belo Horizonte. Como funciona esse programa?
DS – A gente está construindo com a Guarda Municipal, a Secretaria de Segurança Pública e a prefeitura um programa de combate à discriminação e violência contra a comunidade LGBT.
O programa estabelece algumas metas, dentre elas zerar o assassinato de pessoas LGBT em três anos em Belo Horizonte. A segunda meta é qualificar a Guarda Municipal, a fim de que eles estejam preparados para acolher as vítimas de violência. E a terceira é gerar um relatório sobre a violência e discriminação contra pessoas LGBT do município. Isso é importante, porque não existe no Brasil números oficiais sobre a violência contra pessoas LGBT, o que dificulta a criação de políticas públicas.
P. – Sobre as eleições de 2022, a senhora pretende se candidatar?
DS – Após ser eleita, eu recebi ameaças de morte do maior grupo de ódio da internet brasileira. Se as ameaças aprofundarem eu terei que disputar um cargo na esfera federal, a fim de me mudar para um espaço neutro e ter apoio da polícia federal. Além disso, vou acompanhar a conjuntura política. Se a sociedade entender que a minha participação é importante para o Brasil e para as pautas que carrego, eu posso me candidatar.
Já recebi propostas para disputar o governo de Minas Gerais e o Senado. Essas propostas vieram tanto de partidos da direita, quantro da esquerda, mas estou avaliando o cenário, só vou definir no ano que vem.
P. – Ciro Gomes é o pré-candidato do seu partido à Presidência. A senhora já fechou apoio a ele ou avalia outras possibilidades?
DF – Primeiro, eu acho que a nossa maior preocupação é vencer o Bolsonaro e o bolsonarismo, que infelizmente têm aprofundado a crise socioeconômica e ambiental que está no Brasil. Em relação ao Ciro, quando eu me filiei ao PDT, fizemos um compromisso de ajudá-lo na construção de um projeto para o país e a gente está articulando reuniões, a fim de construir um programa alternativo à polarização que há no país.
P. – Como a senhora avalia a polarização entre Lula (PT) e Bolsonaro nas pesquisas?
DF – A polarização é um fenômeno da política. É importante ter dois projetos diferentes para serem votados. O que nós temos que combater não é a polarização, mas a radicalização, que coloca em risco as instituições democráticas. Em relação ao Lula e ao Bolsonaro é importante ver o programa de cada um deles, porque eles ainda não apresentaram o programa, há uma disputa em termos de estarem em campos diferentes. Então, eu vou aguardar para ver os projetos econômicos de cada um.
Por Isac Godinho/FOLHAPRESS
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Redação por Bernardo Andrade