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Com UTIs lotadas, profissionais de saúde revivem traumas em Rondônia

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A enfermeira Raiana Almeida, 32, deixou a família em Porto Velho em janeiro de 2020 para se juntar por três meses ao mutirão de profissionais que reforçaram equipes de saúde no Amazonas.

Foi o período mais crítico da pandemia, e muitos pacientes morreram sem oxigênio nas UTIs.

“Testemunhei muitos óbitos. Todo mundo que trabalhava com a Covid não ficou bem e não está bem ainda”, conta.

Quando a família contraiu o vírus, ela decidiu voltar para Rondônia, no mês seguinte.

Em Porto Velho, encontrou “hospitais cheios de gente, muitas viaturas circulando pela cidade e unidades de saúde cheias”. Mesmo com alguma melhora, um ano depois a enfermeira conta ainda ver muitos internados, entre os quais boa parte se recusa a se vacinar ou não completou o ciclo de imunização.

Rondônia é um dos estados brasileiros com a maior lotação nas UTIs para Covid neste ano. O estado já chegou a atingir neste mês 92% de ocupação dos leitos para os casos mais críticos.

O número de casos diários manteve-se alto, com uma média de 2.247 entre 6 e 12 de fevereiro, segundo levantamento do grupo de pesquisa da Covid da Universidade Federal de Rondônia. Já são 6.972 mortes desde o início da pandemia.

Nas últimas semanas, a dona de casa Angela Jaiker Maia esteve com um dos seus quatro filhos no hospital de campanha. A estrutura, criada em janeiro de 2021 para atender o excesso de pacientes críticos, ainda não foi desmontada.

Maia é moradora da zona sul, no bairro Castanheira, área que teve muitos óbitos e casos de Covid no ano passado. O filho de 13 anos foi internado com pneumonia e influenza.

Ela conta que teve que recorrer ao Ministério Público para conseguir um leito para o filho. “Ele ficou na enfermaria, não precisou ir para UTI. Mas eu tive medo de ser Covid e perder meu filho. No hospital de campanha não tinha muita gente como no ano passado, pelo menos onde eu vi”.

O técnico de enfermagem Lucas Rodrigues, 27, trabalha no Cemetron (Centro de Medicina Tropical de Rondônia), onde funciona a maior estrutura de UTIs.

Ele conta que trabalho durante a pandemia comprometeu sua saúde mental. Desde o começo da propagação da Covid, ele atua na linha de frente.

O profissional de saúde contraiu o vírus em março de 2021 e logo depois a mãe também foi infectada, no mesmo período, mas não foram hospitalizados. Ainda assim continuou trabalhando, mas passou a tomar medicação para dormir.

“Tive muita insônia, fiz tratamento com remédio controlado para dormir. Eu acordava no meio da noite, assustado. Tinha pesadelos com mortes”, conta.

A sensação permanece. “Eu tinha um sono tranquilo, dormia tranquilo. Agora é diferente. Às vezes eu controlo um pouco, vou lá fora do apartamento, respiro e volto. Até me acalmar. A sensação é de desespero, mas tento me acalmar”.

Lucas disse que o governo estadual oferece suporte psicológico para todos os profissionais de saúde. “Eu preciso de tratamento, mas não estou preparado ainda.” Ele diz ter medo de enfrentar as terapias.

Gerente-médico do hospital de campanha de Rondônia, médico há dez anos, Flori Menezes contraiu Covid com a esposa em novembro do ano passado.

Os dois tiveram que ficar isolados dos filhos, mas não houve necessidade de hospitalização. Ele também perdeu amigos para o vírus e viu muitos óbitos entre jovens e idosos.

“A gente trabalhava num cenário com muitas mortes, além do habitual. Era muito diferente de tudo que a gente costuma ver no dia a dia. A gente pede que essa pandemia nunca mais volte a ser como era antes”.

O clínico-geral diz que ele e seus colegas não podiam parar de trabalhar, mesmo sabendo que a saúde mental não estava boa.

“A gente trabalhava porque era nossa missão salvar alguém que precisa, mas também com a cabeça preocupada, pensando: ‘Será que eu não vou ser o próximo na lista de óbitos? E meus familiares?'”, afirma Menezes.

“A gente estava trabalhando e no outro dia ficamos sabendo que seu colega se agravou e precisou ser entubado. Todos os profissionais ficaram abalados”.

A situação atual, segundo ele, é de mais leitos disponíveis e insumos do que em 2021. O cansaço das equipes, porém, pesa após dois anos de pandemia.

O governador Marcos Rocha (PSL), aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL), proibiu por meio de decreto a vacinação compulsória e obrigatoriedade do passaporte vacinal.

Com a alta lotação em UTIs, o comitê científico da Universidade de Rondônia recomenda cautela pela população. “O alto nível de contágio da população vem gerando demandas ambulatoriais e internações, que impactam nas estatísticas e previsões de casos”.

“É urgente a necessidade de divulgação e adoção de estratégias efetivas para alcançar coberturas vacinais adequadas com dois objetivos: proteger a população da evolução para casos graves e óbitos pela Covid-19 e, em segundo lugar, impedir o surgimento de novas variantes, que, no caso, poderão perpetuar a situação pandêmica atualmente vivenciada”, diz o relatório mais recente de análise de cenário do comitê.

Por Francisco Costa/FOLHAPRESS

Foto: Divulgação

Redação por Bernardo Andrade

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Eric Lima

Criador do Portal Pontual

Mestrado em Saúde, Sociedade e Endemias na área de concentração de Epidemiologia de Agravos e Prevalentes na Amazônia pelo instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/FIOCRUZ), Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Universidade Federal do Pará (UFPA - 2013). Tem experiência em pesquisa na área de Epidemiologia, Saúde Coletiva com ênfase em Saúde Pública, Avaliação de Serviço em Saúde e Saúde Baseada em Evidências, desenvolvendo estudos nos temas: Tuberculose, Resistência aos fármacos, Tuberculose Multirresistente, Coinfecção TB/HIV.

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